9 de outubro de 2010

Adolescentes e Álcool

A professora Ana Ventura colaborou com esse texto:
Adolescentes e álcool

Tolerância e dependência são dois eventos distintos e indissociáveis. A tolerância é a necessidade de doses maiores de álcool para a manutenção do efeito de embriaguez obtido nas primeiras doses. Se no começo uma dose de uísque era suficiente para uma leve sensação de tranqüilidade, depois de duas semanas, por exemplo, são necessárias duas doses para o mesmo efeito. Nessa situação diz-se que o indivíduo está desenvolvendo tolerância ao álcool. Normalmente, à medida que se eleva a dose da bebida alcoólica para se contornar a tolerância ela volta em doses cada vez mais altas. Aos poucos, cinco doses de uísque podem se tornar inócuas para o indivíduo que antes se embriagava com uma dose.

Idade: indivíduos que iniciam o consumo de álcool antes dos 16 anos de idade possuem risco 1,3 a 1,6 vezes maior de desenvolver dependência alcoólica;  cada ano de atraso no início da ingestão de álcool seria capaz de gerar uma redução de 14% no risco para a dependência alcoólica. Assim, a idade de início do uso de álcool é um dos principais pontos de referência para avaliar os possíveis riscos de problemas associados.

Os prejuízos decorrentes do uso de álcool em um adolescente são diferentes dos prejuízos evidenciados em um adulto, seja por especificidades existenciais desta etapa da vida, seja por questões neuroquímicas deste momento do amadurecimento cerebral. Alguns riscos são mais frequentes nesta etapa do desenvolvimento, pois expressam características próprias desta etapa, como o desafio a regras e à onipotência.

1) O uso de álcool por menores de idade está mais associado à morte do que todas as substâncias psicoativas ilícitas em conjunto. Sabe-se, por exemplo, que os acidentes automobilísticos são a principal causa de morte entre jovens dos 16 aos 20 anos, e na sua imensa maioria os jovens estão alcoolizados. (...)

2) Estar alcoolizado aumenta a chance de violência sexual, tanto para o agressor quando para a vítima. A ligação entre sexo desprotegido e uso de álcool parece ser afetada pela quantidade de álcool consumida, interferindo na elaboração do juízo crítico (Sen, 2002). (...)

3) O consumo de álcool na adolescência também está associado a uma série de prejuízos acadêmicos: só para citar um, adolescentes com dependência de álcool apresentam mais dificuldade em recordar palavras e desenhos geométricos simples após um intervalo de 10 minutos, em comparação a adolescentes sem dependência alcoólica.

4) A percepção que o adolescente tem sobre os problemas decorrentes do consumo de álcool não acompanha, necessariamente, a hierarquia dos prejuízos considerados mais graves. “Freios sociais” presentes entre os adultos (problemas familiares, perda de emprego, prejuízo  financeiro) – e que muitas vezes são vistos como alertas para a diminuição do consumo – estão ausentes entre os adolescentes. Esta seria uma possível explicação para jovens evoluírem mais rapidamente do abuso para a dependência, quando comparados com os adultos.
Efeitos do uso de álcool na adolescência ao longo da vida:

1) O uso de álcool na adolescência expõe o indivíduo a um maior risco de dependência química na idade adulta, sendo um dos principais preditores de uso de álcool nesta etapa da vida.

2) O uso de álcool em adolescentes está associado a uma série de prejuízos neuropsicológicos. Os efeitos ocorrem em áreas cerebrais ainda em desenvolvimento e associadas a habilidades cognitivo-comportamentais que deveriam iniciar ou se firmar na adolescência.

3) O adolescente ainda está construindo a sua identidade. Mesmo sem um diagnóstico de abuso ou dependência de álcool, pode se prejudicar com o seu consumo, à medida que se habitua a passar por uma série de situações apenas sob efeito de álcool. Vários adolescentes costumam, por exemplo, associar o lazer ao consumo de álcool, ou só conseguem tomar iniciativas em experiências afetivas e sexuais se beberem. Assim, aprendem a desenvolver habilidades apenas possíveis com o uso de álcool e, quando este não se encontra disponível, sentem-se incapazes de desempenhar estas atividades, evidenciando uma outra forma de dependência.

O uso de álcool nesta faixa etária paradoxalmente ainda é combatido e valorizado, dependendo do ângulo em que o fenômeno seja observado: para a mídia e para os pares, o consumo de álcool é favorecido. Para a lei e para os programas de saúde pública, ele é combatido. Neste embate entre forças frequentemente desiguais, encontra-se um indivíduo com a personalidade em formação, como que navegando entre marés com correntezas opostas. Entretanto, independentemente das forças em questão, um ponto é inquestionável no que compete ao consumo de álcool por adolescentes: 1) quanto mais precoce o início de uso, e quanto mais freqüente for o uso até os 20 anos de idade, maior o risco de surgirem consequências graves. Nesse cenário, a atitude da família, nos seus hábitos de dia a dia, é fundamental na percepção que o jovem desenvolve com relação ao álcool e ao seu uso.

Fontes
“Uso e abuso de álcool na adolescência”, de Flavio Pechansky, Sociedade Brasileira de Psiquiatria e UNIFESP, adaptado

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Assine seu comentário.Somente comentários ofensivos ou não assinados não serão publicados.Obrigado por participar.