12 de abril de 2014

O MILHO NOSSO DE CADA DIA



Estamos no final das deliciosas e tradicionais festas do milho da região. Além das delícias gastronômicas, essas festas evocam nossa cultura caipira, tão rica e importante e também as tradições religiosas e a vida em comunidade.
Mas, será que todos repararam no sabor das pamonhas, dos curaus, do milho verde com manteiga? Saborosos como nos anos anteriores? Um pouquinho diferente, talvez?
Se não foi perceptível no sabor, a diferença foi bem acentuada para o meio ambiente da nossa região, nos campos onde, pelo menos uma parte desses milhos foi cultivada.
Isso porque, desde 2007 existem no mercado sementes de milho chamadas de transgênicas, isto é, sementes geneticamente modificadas em laboratórios para serem tolerantes a herbicidas. Ou ainda sementes com a tecnologia Bt, no qual foram introduzidos genes específicos de uma bactéria de solo que fazem com que a planta produza uma proteína tóxica para alguns grupos de insetos, para que a planta resista ao ataque de lagartas.
O agricultor que planta o milho transgênico adquire o agrotóxico e as sementes de uma mesma empresa e ainda paga royalties pelo uso das mesmas.  De acordo com a propaganda, os transgênicos trariam aos agricultores maior produtividade. Porém isso nem sempre acontece...
O que se observa ao longo destes anos é que os insetos que normalmente atacam a cultura e as plantas invasoras adquirem resistência e então é necessário o uso de quantidades cada vez maiores de inseticidas e herbicidas. E normalmente o agricultor tem perda de parte da colheita.

O uso desses agroquímicos (inseticidas, herbicidas, etc.) causa cada vez maiores impactos à saúde humana e ambiental. Por exemplo, está para ser liberado no mercado um herbicida que tem como princípio ativo o “2,4 D”, também conhecido como “agente laranja”. Este produto foi utilizado pelos EUA na guerra do Vietnã para desfolhar as florestas tropicais daquele país, revelando a localização dos soldados inimigos que lá estavam escondidos. O “2,4D”, quase uma arma de guerra, em breve chegará às nossas mesas, através da soja e do milho geneticamente modificados. 
O Brasil vem registrando um aumento expressivo no uso de veneno para lavoura, também chamados de “defensivos agrícolas”, e já somos o maior consumidor mundial desses produtos. O mercado brasileiro gera com isso, bilhões de dólares de lucro para as multinacionais do setor de agroquímicos, enquanto ficamos com o prejuízo da contaminação progressiva de trabalhadores rurais, de animais silvestres, dos nossos solos, rios, córregos, peixes, entre outros. Estudos já apontam a contaminação até das águas subterrâneas, como é o caso do Aquífero Guarani, presente na nossa região e um dos maiores reservatórios de água doce subterrânea do mundo. Enquanto as multinacionais do agroquímico se beneficiam com a venda desses produtos, o prejuízo é dividido entre todos os cidadãos brasileiros.
Mas, voltando ao nosso assunto inicial, a comercialização das sementes dos milhos transgênicos foi aprovada pela Comissão Nacional de Biossegurança / CTNBio, um órgão do Governo Federal. Imagina-se, dessa forma que a aprovação oficial fosse baseada em estudos científicos consistentes que garantissem a segurança ambiental e da população.
Mas, na verdade, os testes de avaliação que a CTNBio utiliza para aprovar um produto são, principalmente, análises técnicas dos aspectos agronômicos, por exemplo, avaliam a adaptação das sementes a um determinado ambiente, avaliam o  aumento da produtividade, etc..
Já os testes para avaliação dos impactos de transgênicos ou OGMs (Organismos Geneticamente Modificados) na saúde humana e no ambiente (fauna, água,solo, etc.) além de pouco considerados, apresentam outro aspecto bastante preocupante: o prazo. A CTNBio considera válidos dados de ensaios técnicos feitos em prazos curtos, com avaliações de, no máximo, 45 dias.
Agora vejam: no ano passado, pesquisadores franceses divulgaram o resultado bombástico, de uma pesquisa bastante simples. Os cientistas alimentaram ratos de laboratório com milho transgênico por 2 anos. Depois de cinquenta dias começaram a aparecer mal - formações e muitas mortes. Houve crescimento excessivo das glândulas mamárias, problemas nos rins e fígado. Aqui no Brasil, esse mesmo milho é, no entanto, comercializado livremente e consumido pela população, talvez até para preparar a pamonha e o curau das nossas tradicionais festas do milho.
Muitos produtores de grãos do Brasil já perceberam que plantar milho e soja transgênicos nem sempre é um bom negócio. A Associação Brasileira dos Produtores de Grãos Não Geneticamente Modificados (Brazilian Association of Non Genetically Modified Grain Producers)/ ABRANGE); que tem como associados grandes empresas como o Grupo André Maggi, a Brejeiro, a Caramuru Alimentos S/A; vem ampliando sua produção e exportação de grãos já que a China, Rússia e vários países da Europa proíbem a entrada de soja e milho transgênicos. O mercado mundial tem uma demanda crescente por produtos não transgênicos e os preços pagos são significativamente maiores do que o valor dos grãos transgênicos.
Hoje em dia, o produtor rural que optar por plantar o bom e velho milho crioulo - não transgênico e não híbrido - tem muita dificuldade em encontrar sementes. O milho cateto, o milho cunha, milho palha roxa, e tantos outros que os agricultores da região conhecem bem, estão desaparecendo, pois as sementes estão acabando.  Pelo menos aqui em São Paulo contamos o bom trabalho do Departamento de Sementes, Mudas e Matrizes da CATI, da Secretaria Estadual de Agricultura produzindo variedades de milho não transgênicos adaptados ao nosso clima. Mas, mesmo se o produtor conseguir estas sementes corre o risco de ter sua plantação contaminada pelo milho transgênico que um vizinho plantou, já que o pólen do milho se espalha pelo vento. A CTNBio diz que apenas 100 m de borda de proteção é suficiente para milhos diferentes não se contaminarem. Imagine com os ventos aqui em Botucatu ...
Então, já temos uma suspeita sobre a diferença do sabor dos quitutes da festa do milho.
É por estas e outras que, esses novos modelos de produção de grãos como o milho, a soja e o feijão e quaisquer outros organismos geneticamente modificados devem ser repensados com muita cautela e responsabilidade.
Dr. Pedro Jovchelevich
 pedro.jov@biodinamica.org.br

Engenheiro Agrônomo – Coordenador da Associação Biodinâmica de Botucatu 

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